Convento da Penha (Vila Velha-ES): turismo religioso, histórico e ecológico

Cássia Araujo e Souza (Professora, Historiadora. Mestra em Educação)
Sany E. A. e Souza (Turismóloga. MBA Marketing, Comunicação e Eventos)

 

O atrativo desse monumento é tão incrível que mesmo antes da chegada, você já vivencia a história do lugar. A entrada do convento é a mesma da prainha, onde em 1535 o primeiro capitão donatário Vasco Fernandes Coutinho aportou para colonização do solo espírito-santense.

Você levanta os olhos e não dá para acreditar que, na ponta do penhasco de 154 metros de altura, está um templo religioso tão bem construído e conservado, em todo seu esplendor e beleza.

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

O Convento da Penha é um santuário de devoção mariana que se destaca como um dos mais antigos do Brasil. Indiscutivelmente é o mais importante atrativo turístico e religioso do Espírito Santo.

Do alto é possível apreciar as mais raras belezas naturais e construtivas, de Vitória e Vila Velha, além do vislumbre de grande extensão Oceano Atlântico (o mar está posicionado a seus pés, cerca de 500 metros de distância).

Assim, a visão deslumbrante do litoral capixaba se descortina diante dos olhos do observador, que pode apreciar as praias, os portos, montes e pontes, desenhando a ilha de Vitória entre o mar e as montanhas distantes. E, a partir do processo de subida, você encontra uma série de espaços para apreciar a natureza, meditar e explorar.

O convento em si foi construído em meio a Mata Atlântica, hoje uma área de reserva com 632.226m² de área verde, intacta, que ladeiam o monumento. Desse modo, a simples subida até o convento já é uma dádiva.

O portão atualmente em uso data de 1952.

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

São 3 opções de subida:

  1. contrata uma van, ao pé do morro;
  2. sobe à pé pela via de veículos, com calçada. São 1200m de estrada de pedras, serpenteando a mata, construída em 1928, denominada como Dom Luiz Scortegagna e;
  3. sobe à pé pela estrada velha, com acesso apenas para pedestres. Trata-se da mais antiga via de acesso ao convento.

O antigo caminho (estrada velha)

O caminho antigo ou a estrada velha geralmente é a primeira opção de romeiros, que muitas vezes fazem o percurso de subida descalços ou de joelhos. Recomendamos essa via para a subida e a estrada para descida ou vice versa. Não dá para abrir mão de conhecer a estrada velha, por seu caráter histórico. Muitas personalidades fizeram esse trajeto no período colonial. Foi esse o caminho percorrido pelo imperador D.Pedro II, com sua comitiva em 1860. Também era a mesma via utilizada por Padre José de Anchieta.

A estrada velha é também denominada como:

  1. “Estrada da Penitência” – muitos optam por esse caminho penitencial em função do esforço necessário. São 457 metros de subida íngreme, construída segundo o modelo colonial, por nativos locais e escravos, em 1643. A obra foi comandada por Frei Paulo de Santo Antonio, guardião do convento. Entre 1774-77 a estrada foi renovada e até hoje mantém a aparência recebida.

Essa é uma ótima opção como roteiro ecológico, onde é possível apreciar árvores e calçamento seculares. É ladeada por muros baixos, deixando a mostra a exuberância da mata do entorno e a biodiversidade.

  1. “Ladeira das Sete Voltas” – são 7 curvas graciosas.
  2. “Ladeira das Sete Alegrias” – De acordo com o instituído e propagado pela ordem franciscana, representam as 7 alegrias de Nossa Senhora: A anunciação – A visita à prima Isabel – O nascimento de Jesus – O recebimento do Espírito Santo – A apresentação de Jesus ao templo – A ressurreição – A assunção de Nossa Senhora.
Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

A desvantagem desse caminho é que a ação do tempo e muito uso, tornaram o calçamento de pedras (pé de moleque) muito disforme e escorregadio.

As duas estradas seguem até o campinho. A partir dali a subida é feita pela escadaria de 365 degraus. Na medida que você sobe, mais e mais belezas se descortinam aos seus pés. A vista é deslumbrante. Você não se cansa de filmar e fotografar. O visitante não quer perder nenhum detalhe. Além desses, há muitos outros atrativos.

Atrativos e estruturas existentes do caminho até o convento:

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

Altar de São Francisco de Assis

São Francisco de Assis é padroeiro da ecologia, defensor da criação e fundador da ordem franciscana. O altar encontra-se na estrada principal.

Gruta de frei Pedro Palácios

Na entrada velha

Campinho

Em muitas situações esse é o ponto final para alguns devotos, impossibilitados de subir até o convento. Foi pavimentado em 1951, no governo Jones dos Santos Neves e atualmente é um espaço de retomada de fôlego, antes da escadaria e dispõe de variadas estruturas.

O campinho é um espaço existente entre a ladeira e as escadarias que dão acesso ao monumento e geralmente é ocupado como área de estacionamento.

Em ocasiões de mega eventos, como a festa da Penha e as comemorações de Natal, o campinho fica livre para celebrações de missa e outros eventos.

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

Mirante

Embora tudo na estrutura do convento aponte para paisagens diversas, o mirante é o local oficial para visualização das belezas naturais e construtivas ao entorno. Erguendo o olhar, o convento ladeado pelas palmeiras já é um presente. Ao redor, há uma série de atrativos e para baixo, as belezas de Vitória e Vila Velha se descortinam aos seus pés.

O mirante também fica no campinho e tem recursos de proteção, especialmente para crianças.

Capelinha de São Francisco de Assis

Nesse local faleceu o frei Pedro Palácios, no dia seguinte às comemorações da Penha, em 1570. Seu corpo foi depositado na ermida Nossa Senhora da Penha.

A capelinha foi construída no campinho, entre 1558-62 e possui 20m². Seu telhado é em estilo colonial.

Outro recanto de adoração a São Francisco. Trata-se da extensão da capelinha. Ao redor há bancos e espécies variadas da fauna e flora local, além da vista privilegiada.

Praça de alimentação

Localizada no campinho, a praça dispõe de uma lanchonete, com salgados, doces e acompanhamentos. Há bancos e cadeiras para acomodação dos romeiros e visitantes.

Lojinha

Também localizada no campinho, a lojinha do convento comercializa produtos oficiais e religiosos, como terços, camisetas, livros, lembranças, souvenir em geral, com possibilidade de personalização de algumas peças.

Espaço de exposições

Espaço multiuso e acolhedor, localizado no final da subida da Penha, utilizado para exposição de artes, seminários e reuniões. A  sala não recebe apenas obras religiosas ,mas também de cunho cultural, artístico e histórico. Assim, expõe tanto peças do próprio acervo quanto de acervos externos.

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

Sala dos Milagres

Nessa sala são expostos, há muitas décadas, variados objetos de fé e gratidão dos devotos (fotos, estatuetas, próteses, cartas, flores, etc.).

A Sala dos Milagres foi criada em 1952 e expõe em redoma a réplica da imagem peregrina de Nossa Senhora da Penha

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

O convento

No alto das escadarias, suado e cansado, depois de já haver passado por tantos atrativos especiais, temos a cereja do bolo: o próprio convento. Ali suas forças se renovam. Ele é belo, é fresco, super arejado e muito, muito bem ornamentado. Quando suas enormes janelas se abrem, não trazem apenas a brisa gostosa do mar, mas também enche os olhos dos turistas, com uma estonteante beleza. Não há como não bendizer a Deus por uma criação natural e humana tão perfeita.

Historicamente o convento é obra iniciada no período colonial, mais precisamente em 1558. O frade espanhol, Frei Pedro Palácios determinou que se erguesse ali um pequeno santuário a Nossa Senhora da Penha. Ele certamente não tinha noção do impacto que sua obra exerceria sobre os visitantes, fieis da virgem ou não. Para ali se movem diariamente centenas de pessoas (e milhares durante as festividades)  onde se congregam católicos ou não católicos, para apreciar a beleza do lugar, sua santidade ou mesmo seu conjunto arquitetônico e obras artísticas.

Para iniciar o processo construtivo do convento o guardião Francisco da Madre de Deus contou com donativos. O governo do Rio de Janeiro contribuiu até 1848 para a manutenção do convento, doando inicialmente 30 novilhos, que foram utilizados pelos franciscanos para a geração de renda.

Os franciscanos utilizavam a Ilha dos Bentos (atual Ilha do Frade) como espaço isolado para criação de gado e cavalos.

Em 1591, dona Luzia Grinaldi, a viúva de Vasco Fernandes Coutinho Filho, o segundo donatário da capitania obteve aprovação das lideranças  políticas e doou todo o morro do convento para a ordem franciscana.

Em 1630, pela bula do papa Urbano VIII Nossa Senhora da Penha foi proclamada padroeira do Espírito Santo.

Em 1943 o convento foi tombado pelo IPHAN e entre 2009-13 passou por obras de restauro, valorizando sua beleza arquitetônica e decorativa. O  espaço interno é de cair o queixo, uma verdadeira viagem no tempo. Seguindo o estilo rococó, predominam cores claras, tons pasteis e douramento.

Fotografia: acervo particular (Sany E.A.e Souza)

Obras que você pode apreciar:

  • Imagem da virgem da Penha, com mais de 400 anos, centrada no retábulo, oriunda de Portugal, sob encomenda de frei Pedro Palácios, em 1569, ornada com anjos e querubins em suas laterais;
  • Retábulo e colunas adornados com mais de 200 peças de mármore, de mais de 19 tipos;
  • Imagens dos principais santos franciscanos, São Francisco de Assis e Santo Antonio, de Lisboa e Pádua;
  • A beleza do cedro que reveste a capela-mor, entalhada com motivos fitomorfos, mostrando o talento do escultor português José Ernandes Pereira, nas obras executadas de 1874-79;
  • Assoalho trabalhado na arte de marchetaria;
  • Arte do século XIX, como a talha dourada de madeira, de autoria do escultor italiano Carlo Crepaz (mesmo autor da estátua do índio Arariboia);
  • Caligrafia eclética, capitéis, coríntios, festões, guirlandas, medalhões, anjos e frontão;
  • A arte de Vitor Meireles nas paredes, concluídas em 1877, sob encomenda de frei João Costa;
  • Obras sacras de Benedicto e Pedrina Calixto, de 1926-27.

O convento e a exploração da mão de obra escrava

Especialistas apontam que sem a exploração do trabalho escravo não seria possível a construção do convento. A princípio foi utilizada a mão de obra indígena, sendo substituída pelo trabalho dos negros. Eles eram utilizados em diversas frentes de trabalho, atuando nos pomares, nos currais com criação de gado e cavalos, nas obras de construção, tanto do convento quanto no calçamento das vias de acesso. Também construíram senzalas, o cais e recursos para armazenagem e celeiro na prainha.  

Em ocasiões festivas eram os escravos que pediam esmolas, para manutenção do convento, aos romeiros. Também eram alugados para prestar serviços aos moradores tanto de Vitória quanto de Vila Velha, prática comum para ampliar a renda dos senhores de escravos.

Em 1872, nas proximidades da abolição (1888) o convento contava com 42 escravos.

Vale lembrar que a escravidão foi fruto de sua própria época. Felizmente hoje os portões do convento da Penha se abrem para todos que estejam dispostos a honrar Maria ou simplesmente contemplar a natureza divina de Deus, independente do credo que professa, etnia, opções políticas ou sexualidade.

No convento, os cristãos que seguem o catolicismo podem assistir missas diariamente. Podem ainda marcar na secretaria uma oportunidade de confissão.

 

 

Referências
Conheça a história do Convento da Penha. Disponível em: https://conventodapenha.org.br/conheca-a-historia-do-convento-da-penha/?fbclid=IwAR0cAckHU4xY1wj6NmcNlwJHjXBNwRegMik5ckBe_x4gJfbFDZ83hQbLAY. Acesso em 02/03/23
Convento da Penha foi um marco da engenharia no período colonial brasileira. Disponível em: https://g1.globo.com/es/espirito-santo/especial-publicitario/confea/noticia/2019/10/18/convento-da-penha-foi-um-marco-da-engenharia-no-periodo-colonial-brasileiro.ghtml?fbclid=IwAR2eQzdvp3dknDIFjy9h6axcE8kYdEH8GDI3FVVsa1U2NGifuubgK7M6s2s. Acesso em 02/03/23
O Convento. Disponível em: https://patrimonioconventodapenha.com.br/o-convento/?fbclid=IwAR0cAckHU4xY-1wj6NmcNlwJHjXBNwRegMik5ckBe_x4gJfbFDZ83hQbLAY.
Acesso em 05/03/23
454 anos de história. Disponível em: https://conventodapenha.org.br/454-anos-de-historia/?fbclid=IwAR016uzmv9aqqV_UPCR_i2oA1S2hVbCV04DNccTw5fb-ip7v1xrRxApLDg4.
Acesso em 06/03/23
Outeiro, Convento e Igreja de Nossa Senhora da Penha – Vila Velha (ES). Disponível
em: http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1363/. Acesso em 06/03/23
Aconteceu na Penha | Cronologia da nossa história. Disponível em: https://conventodapenha.org.br/aconteceu-na-penha-cronologia-da-nossa-historia/. Acesso em 06/03/23